A CGTP-IN e o Tratado Reformador

O Conselho Nacional da CGTP-IN, reunido em 31/10/2007, procedeu a um primeiro debate sobre os conteúdos do “TRATADO REFORMADOR”
 
 
A CGTP-IN E O TRATADO REFORMADOR
(Primeira apreciação)


O Conselho Nacional da CGTP-IN, reunido em 31/10/2007, procedeu a um primeiro debate sobre os conteúdos do “TRATADO REFORMADOR”, cujo texto final foi aprovado pelos Chefes de Estado e de Governo presentes na CIG em 18 e 19 de Outubro, em Lisboa, e que está previsto ser assinado em 13 de Dezembro de 2007, no Mosteiro dos Jerónimos, ficando em aberto o método de ratificação a adoptar por cada Estado Membro.
 
1.    Uma primeira constatação é que a CGTP-IN quer uma Europa que se afirme, no contexto internacional, como um projecto de paz, com justiça e progresso social, assente no desenvolvimento sustentável e, como tal, seja entendida como uma alternativa ao neoliberalismo que marca o processo de globalização em curso.
É neste contexto que valorizamos uma construção europeia diferente, bem como afirmamos que é no seu quadro que defendemos que se deverá continuar e reforçar a acção e luta sindical, social e política contra o neoliberalismo.


2.    Uma primeira constatação diz respeito ao método utilizado. Perante a rejeição, por parte dos povos francês e holandês, do chamado Tratado Constitucional, e depois de um largo período de “debate alargado”, a Comissão Europeia acolheu a proposta francesa e alemã de um Tratado simplificado a que se convencionou chamar Tratado Reformador.


3.    Contrariando a proclamada intenção de um Tratado simplificado, a versão aprovada manteve mais de 90% da anterior proposta do Tratado Constitucional, o que significa que, com roupagens novas, nos pretendem impor a mesma receita de fortíssimo pendor neoliberal que já havia sido rejeitada.
4.    Quanto aos conteúdos, constatamos que os principais problemas que já haviam sido objecto da nossa crítica ao projecto de Tratado Constitucional se mantêm:


5.    Realçamos assim que:


5.1.    O Tratado Reformador, ainda que com diferenças de redacção, visto terem sido eliminadas as referências explícitas ao primado “duma economia de mercado aberta e de livre concorrência” que constavam do artigo III-187º do Tratado Constitucional, mantém, na generalidade, a mesma filosofia sobretudo quando: i) impõe a supressão progressiva às restrições ao Investimento Directo Estrangeiro (IDE), (artigo 188º-B) o que fundamenta a abordagem neoliberal contida no Livro Verde sobre relações de trabalho e a Flexigurança; ii) tem a realização do Mercado Interno como grande prioridade, o que pode significar que iniciativas como a do projecto de directiva Bolkstein poderão surgir de novo; iii) mantém o papel atribuído ao Banco Central Europeu, exclusivamente dedicado a garantir a estabilidade quer dos preços, quer da política monetária e cambial, bem como garantir a disciplina no cumprimento do “deficit” público, numa visão maximalista dos critérios de convergência;


5.2.    Mantém igualmente a via livre para a formação de um Directório de grandes países, que não deixarão de aproveitar essa porta aberta pelo novo artigo 10º do Capítulo IV quando permite que nove (9) Estados Membros possam criar um mecanismo de cooperação reforçada que “vise favorecer a realização dos objectivos da União, preservar os seus interesses e reforçar o seu processo de integração”, acrescentando o nº 2 que (…) “uma cooperação reforçada é adoptada como último recurso pelo Conselho, quando este determinar que os objectivos das cooperações em causa não podem ser atingidos num prazo razoável pela União no seu conjunto e desde que, pelo menos, nove Estados Membros participem na cooperação”, o que possibilita a colocação da U.E. ao serviço dos seus interesses particulares, em clara violação do princípio elementar da igualdade entre Estados e abrindo caminho a uma Europa a várias velocidades.

5.3.    Representa uma fragilização da vertente social, na linha do reforço da perspectiva neoliberal, ao retirar a Carta dos Direitos Sociais do texto do Tratado remetendo-a para um Anexo, o que significa uma inquestionável desvalorização política e, em simultâneo, ao aceitar pacificamente, em troca de arranjos políticos, que os governos inglês e polaco (para já!) se possam socorrer da possibilidade de ficar de fora da aplicação da Carta nos respectivos países (opt-out).

5.4.    Igualmente desvalorizado surge o Diálogo Social. A hierarquia dos temas em qualquer Tratado não é irrelevante, pelo que é negativo que a menção ao Diálogo Social tenha sido deslocada do Artigo 5º, no anterior Tratado, para o Artigo 136º. Esta desvalorização é tanto mais grave quando se assiste a um ataque à contratação colectiva na União Europeia e em Portugal e, como sabemos, para os trabalhadores não haverá diálogo social com conteúdo sem efectivação da negociação e da contratação colectiva.

5.5.    Confirma-se que, em relação a um dos mais polémicos temas, o da transferência de soberania, tudo se mantém na mesma relativamente ao que já estava inscrito no Tratado Constitucional. Isto é, a transferência de fatias significativas de soberania dos Estados, alienadas em nome de Políticas Comuns: são os casos da Política Externa e de Segurança, da Política de Pescas e da gestão dos nossos recursos marinhos (artigos 10º-C para a PESC e 32º para agricultura e pescas).
5.6.    Portugal, enquanto Estado soberano, perde mecanismos de intervenção: dois deputados no Parlamento Europeu, bem como um Comissário durante largos períodos de tempo, visto estarmos sujeitos à política de rotatividade.

6.    A opção de manter o essencial do falhado tratado Constitucional, mudando o nome e o método de ratificação, afastando ostensivamente os trabalhadores e os povos do debate e da decisão, além de significar um medo imenso do julgamento dos eleitorados, é, acima de tudo, um logro que não pode deixar de ser denunciado.

7.    Por todas estas razões, e tendo presente as práticas políticas concretas que vão sendo seguidas, nomeadamente pela Comissão e pela maioria dos governos dos diversos países e, em particular, em Portugal, pelo governo de José Sócrates, a CGTP-IN mantém a exigência da realização de um Referendo, que propicie um amplo e participado debate na sociedade portuguesa, a preceder o pronunciamento dos portugueses sobre a matéria em causa.

8.    Queremos uma Europa social e solidária com Estados sociais fortes que garantam uma efectiva protecção social, serviços públicos de qualidade, mercados de trabalho regulados por normas de trabalho, de negociação colectiva como fonte de direito, com sentido de progresso e respeitadora dos direitos adquiridos e com diálogo social, assente numa base séria e no respeito pelo papel e intervenção dos sindicatos, em contraposição a políticas desenvolvidas e reafirmadas no Tratado.

Lisboa, 31 de Outubro de 2007


O Conselho Nacional da CGTP-IN